Habituei-me a ver-te, mãe, a sair apressada pela manhã, ainda antes das oito e a acordar-me antes de ir com um recado sempre importante para o dia. Sabia que estavas já acordada há muitas horas, pois o cheiro a comida acabada de fazer, àquela hora já me havia entrado pelas narinas, vindo da cozinha, passando o corredor gelado em direcção ao pobre quarto enegrecido pela humidade nas paredes e no tecto, onde dormíamos as duas, as duas irmãs com dois anos de diferença, aquecidas por quilos de cobertores, pesados em cima de nós, aquecidas pelo corpo uma da outra, por falta de dinheiro para aquecedores e electricidade.
Lembro que saías sempre apressada, com o almoço do pai numa marmita embrulhada em jornais e que deixavas escritos os recados num papel, em cima da mesa da cozinha, caso eu não tivesse ouvido tudo por estar ainda meio adormecida. Saías apressada para trabalhar a duas horas de distância, para apanhar por vezes três transportes até lá chegar e, depois de oito ou mais horas de trabalho, regressar pelo mesmo caminho e chegar já tarde a casa, por vezes depois das oito, para repetir tudo de novo e seres a última a deitar-te.
Pergunto agora, mãe, já adulta e mãe também, porque nunca tiveste férias. Pergunto porque nunca sentiste falta de uma viagem, de um cinema, de um concerto, de um teatro, de um vestido novo, de maquilhagem, de uma massagem, de um spa, de um creme novo, de uns sapatos a combinar com a carteira.
Pergunto, mãe, como conseguiste viver toda uma vida sem saber o que era uma noite romântica, um jantar a dois à luz das velas, sem saber o que era receber um presente (“É para ti. Comprei-o, porque pensei em ti, porque reconheço que tenho uma grande mulher ao meu lado, porque te admiro, porque sou um felizardo por te ter a meu lado.”) Pergunto, mãe, como pudeste pensar só nos outros, nos filhos, no marido, na família e te esqueceste completamente de ti.
“Só quero descansar um bocadinho. Dói-me tanto a cabeça.”
Recordo estas palavras recorrentes que entraram, também, por mim dentro como o cheiro dos teus cozinhados pela manhã, bem cedo. Habituei-me a ver-te cansada, mas nunca desanimada. Habituei-me à tua mão áspera que raramente me fazia uma festa no rosto (talvez porque também nunca o tenhas recebido em criança), mas que me aconchegava a roupa da cama antes de dormir e para mim isso era carinho, isso era segurança.
Recordo que cresci sem medo. Ainda hoje não o tenho. Sabia que tu, mãe, resolverias tudo. Arranjarias sempre solução para as rasteiras que a vida nos preparasse. Habituei-me a ver-te a cair e a não chorar, mesmo grávida, com quarenta anos, aflita por dentro por não saber se tudo estava bem… Grávida aos quarenta, porque o amor era maior, maior que a desilusão, maior que o deserto no peito, maior que a dor nos ossos que já moía a doçura do sono.
Habituei-me a ver-te, mãe, como uma super mulher…
E para todas as super mulheres como tu, não existem palavras nem canções suficientes para dizer o quanto valem…
Lembro que saías sempre apressada, com o almoço do pai numa marmita embrulhada em jornais e que deixavas escritos os recados num papel, em cima da mesa da cozinha, caso eu não tivesse ouvido tudo por estar ainda meio adormecida. Saías apressada para trabalhar a duas horas de distância, para apanhar por vezes três transportes até lá chegar e, depois de oito ou mais horas de trabalho, regressar pelo mesmo caminho e chegar já tarde a casa, por vezes depois das oito, para repetir tudo de novo e seres a última a deitar-te.
Pergunto agora, mãe, já adulta e mãe também, porque nunca tiveste férias. Pergunto porque nunca sentiste falta de uma viagem, de um cinema, de um concerto, de um teatro, de um vestido novo, de maquilhagem, de uma massagem, de um spa, de um creme novo, de uns sapatos a combinar com a carteira.
Pergunto, mãe, como conseguiste viver toda uma vida sem saber o que era uma noite romântica, um jantar a dois à luz das velas, sem saber o que era receber um presente (“É para ti. Comprei-o, porque pensei em ti, porque reconheço que tenho uma grande mulher ao meu lado, porque te admiro, porque sou um felizardo por te ter a meu lado.”) Pergunto, mãe, como pudeste pensar só nos outros, nos filhos, no marido, na família e te esqueceste completamente de ti.
“Só quero descansar um bocadinho. Dói-me tanto a cabeça.”
Recordo estas palavras recorrentes que entraram, também, por mim dentro como o cheiro dos teus cozinhados pela manhã, bem cedo. Habituei-me a ver-te cansada, mas nunca desanimada. Habituei-me à tua mão áspera que raramente me fazia uma festa no rosto (talvez porque também nunca o tenhas recebido em criança), mas que me aconchegava a roupa da cama antes de dormir e para mim isso era carinho, isso era segurança.
Recordo que cresci sem medo. Ainda hoje não o tenho. Sabia que tu, mãe, resolverias tudo. Arranjarias sempre solução para as rasteiras que a vida nos preparasse. Habituei-me a ver-te a cair e a não chorar, mesmo grávida, com quarenta anos, aflita por dentro por não saber se tudo estava bem… Grávida aos quarenta, porque o amor era maior, maior que a desilusão, maior que o deserto no peito, maior que a dor nos ossos que já moía a doçura do sono.
Habituei-me a ver-te, mãe, como uma super mulher…
E para todas as super mulheres como tu, não existem palavras nem canções suficientes para dizer o quanto valem…
What a lovely song!...