A roupa dá voltas dentro da máquina de lavar. O meu chá esfria um pouco em cima da mesa da sala. A tarde está quente e é verão. Mesmo no verão gosto de beber chá.
A minha mãe leva a bacia cheia de roupa suja à cabeça para lavar no pequeno ribeiro. Hoje está de folga e só quando está em casa pode ir lavar a roupa. Somos muito pequenas ainda, por isso todo o processo é divertido. É bom ter a mãe em casa, há um suave aconchego em tê-la em casa, ainda que esteja sempre a trabalhar nos raros dias de folga. Não me lembro de algum dia a minha mãe ter brincado connosco… O carreiro estreito pelo meio dos campos em direcção à Presa (é este o nome do pequeno curso de água) enche-nos os pés de pó. Ouvem-se vozes de outras mulheres a conversarem animadas enquanto lavam. O olhar cansado da minha mãe não demonstra muita animação.
A máquina de lavar parou. E, sem esforço, retiro a roupa para uma bacia e levo-a para a varanda onde a estendo comodamente num estendal leve de alumínio. O cheiro a amaciador da minha roupa lavada confunde-se na minha memória com o cheiro a sabão azul em barra ou sabão Clarim da minha mãe. A lavagem da roupa era sempre tarefa para algumas horas, de tal forma que a nossa mãe levava lanche para nos dar a meio da tarde: um pão com Tulicreme e uma peça de fruta. A roupa com nódoas difíceis cora ao sol envolvida em sabão, colocada em cima de uma pedra estrategicamente encontrada para o efeito. Brincamos com pedras, corremos pelos carreiros estreitos junto à água e a tarde passa demoradamente como os anos longos da nossa infância.
Agora as tardes são curtas e sem histórias, passam rápido demais como um sopro. As férias de verão acabam mal começam e a magia do calor demorado na pele perde-se passados uns curtos dias. As tardes da minha infância demoravam semanas na minha cabeça, sobretudo nos dias em que a minha mãe não estava e nunca mais chegava do trabalho. As tardes em casa da Sr.ª. Linda, a ama querida que tivemos até terminar a escola (nunca me deu uma palmada sequer… chorei-a mais no seu funeral do que a morte das minhas avós), a brincar no terraço de lousa cinzenta e quente, as tardes eram longas e eu pensava que nunca mais crescia para ser uma mulher grande e independente e mandar na minha própria vida.
Acabei por crescer irremediavelmente e a minha mãe acabou por comprar um tanque de lavar roupa para casa e mais tarde uma máquina de lavar. O meu filho nunca me viu com uma bacia à cabeça no meu dia de folga, nem nunca comeu pão com Tulicreme enquanto brincava na água do riacho à espera que eu terminasse a cansativa lida de lavar a roupa. O meu filho não conhece o cheiro do sabão azul ou do sabão Clarim e não encontra nenhuma magia no cheiro do amaciador que uso na roupa. Não sei se o meu filho gostaria mais que eu usasse o sabão que tem o cheiro da minha infância…