sábado, março 03, 2012

Parabéns Mãe !

Uma hora da tarde de sábado e desta vez não tenho dificuldade no estacionamento.
Saio do carro desalentada.
Trespasso os dois portões, verdes e envelhecidos.
Hoje não estão semi-abertos, como é hábito. Escancarados, esperam por mim.
Caminho na tua direcção.
Reina o silêncio, o silêncio dos mortos.
Ouve-se apenas o barulho dos saltos das minhas botas a ressoar no alcatrão.
"É o barulho da cavalaria", como me dizias quando me ouvias chegar. Sorrio e prossigo.
Mais meia dúzia de passos e baixo a cabeça. Tento conter-me mas já não consigo.
É sempre mais forte do que eu, mas isso agora já pouco me importa.
Paro junto a ti e sufocam-me as saudades. Penso por instantes que não é verdade, mas é. Uma verdade dolorosa, paralisadora e incontornável.
Assaltam-me as memórias de um passado que me parece tão próximo.
Afinal hoje seria dia de festa, o dia da tua festa.
Começaria como era hábito, telemóvel em voz alta, a caminho do colégio comigo e com o Gonçalo a cantar-te os Parabéns. Ou melhor, a gritarmos os Parabéns!
Ainda te oiço a dizer-me, feliz e envergonhada "Ai filha, tu és tão maluca".
Ignorar-te-ia e continuariamos a nossa algazarra.
Revejo-te já à noite, em casa. Terias como gostavas, o teu adorado bolo de anánas com chantilly, que por sinal já todos tinhamos enjoado. Todos menos tu, claro!
E soprarias as velas, embora nunca as trincasses e nunca pedisses nenhum desejo para ti.
Aliás, tu nunca pedias nada para ti. Pedias só para os outros, para as filhas, para o marido e para o neto. Nos últimos anos ficava a observar-te, e era eu quem secretamente pedia o teu desejo. Pedia saúde. Sempre, apenas e só, saúde!
Oiço um "Boa tarde", respondo, desperto e retorno ao lugar de onde ainda não tinha saído.
Retorno ao talhão 35/2010.
Retiro as flores velhas e secas que ali deixara há um mês. Substituo pelo ramos de rosas vermelhas que acabei de comprar.
Mantenho vivo esse nosso ritual, rosas vermelhas a 3 e a 7 de Março.
E revejo o teu sorriso quando as recebias.
Toca o telemóvel e é o pai. Pergunta a que horas vai almoçar comigo, digo-lhe com o ar mais natural deste mundo, que pode ir porque estou quase a chegar.
Viro as costas e sigo o meu caminho.
Junto aos portões paro e olho para trás. No cinzento escuro da tua campa, sobressaiem as rosas, frescas, vermelhas e viçosas.
O vazio e a saudade invadem-me de novo e desejo-te, mais uma vez, PARABÉNS...

2 comentários:

Anónimo disse...

A dor que a saudade e o amor trazem lembra-nos a nossa humilde condição: somos pó. Contudo, somos Luz também e essa luz continua presente na memória e para a eternidade. O amor a uma mãe é eterno. Os parabéns à tua Mãe, Mimi, são a prova que a sua luz continua a brilhar em ti e para ti. Um beijo enorme no teu coração.

Claudia disse...

Ainda estava nas primeiras frases e já as lágrimas não me deixavam ler mais... a saudade é terrivel e esta então é insuportável pois quem se ama partiu de vez :(
"...e uma flor sobre a pedra vais deixar de cada vez que te lembrares de mim..." e deixaste e deixarás.
Beijinho, amiga.